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DESFIANDO O ROSÁRIO
Lilian França - Curadora

A palavra rosário significa ”coroa de rosas”, pois houve um tempo em que a cada Ave Maria rezada, devia-se receber uma rosa. Essa prática iniciou-se por volta do ano 800 e tem sido empregada por praticamente todo o mundo Cristão. O Rosário tradicional é composto de três terços e cada terço compreende cinco mistérios, subdivididos em dez “Ave Marias” e um “Pai Nosso”.
“Desfiar o Rosário” significa, dentro da religião, rezar essa oração, a oração do Rosário, “de dez em dez” contas.
Popularmente a expressão ganhou o significando de uma narrativa, ou de muitas: “desfiar o rosário de sua vida”, “desfiar o rosário de seus problemas”, “desfiar o rosário de suas aventuras”, “desfiar o rosário de possibilidades”; uma expressão que indica sempre o início de uma longa lista que vai, aos poucos, se apresentando.
No cenário da arte contemporânea, “Rosário” remete diretamente ao mestre, Arthur Bispo do Rosário, sergipano de Japaratuba, que em sua vida de artista desfiava uniformes, pedaços de tecido, com os quais envolvia objetos do cotidiano – colheres, garrafas, canecas, entre outros – ou bordava mantos-passaporte para um universo transcendental, cuja entrada só se daria se o nome estivesse bordado em um desses mantos.
Essas três raízes deram nome a exposição que a Sociedade SEMEAR apresenta, reunindo obras de dez artistas contemporâneos que trabalham no Estado.
Esse foi também o fio condutor que procurou ligar cada “conta”, cada obra, amarrada por dois eixos principais: a nova leitura de objetos do cotidiano e de cenas do cotidiano e o aspecto insano pelo qual a sociedade contemporânea se apresenta quando procura conformar “os diferentes” nos padrões de um molde único.
Assim são as cabeças cozidas sobre escadas ou aparadas em bacias de Ana Carolina e as imagens aflitas dos homens constrangidos dos vídeos de Marcos Vieira; as casas transparentes de Fábio Sampaio, deixando a mostra seus intestinos e a cerâmica serigrafada de João Valdênio, que tira do escuro o mundo erótico encerrado na clausura do cotidiano; os seres amorfos de Milton Coelho, surgidos do universo do reciclável, contorcidos, alucinados, esmagados pelo peso da sociedade e os objetos críticos de Alan Adi, sempre a postos para expor as feridas do tempo. Assim são os óleos e os desenhos de Jamson, vibrantes, fortes, ásperos, contundentes e os guarda-chuvas de Marly, protegidos em caixas, desvelando suas estruturas, transformando-se de protetores em provocadores; os colchões de Elias, marcados pela vida e pelo tempo, deixam a mostra as manchas que não se conseguiu limpar e que foram integradas e aceitas num novo contexto; os tapumes de Bené que incitam a “ver” enquanto vedam, impedem, interditam, redirecionando tráficos e caminhos.
Primeira de uma série, espera-se, “Desfiando o Rosário” apresenta um primeiro grupo, um primeiro “mistério” da arte contemporânea em Sergipe. Idealizada por Marcos Vieira (que cedeu sua pauta na Galeria Jenner Augusto) e Fábio Sampaio, contou com o apoio incondicional da diretora da Galeria, Cita Domingos, que vem dando espaço a arte contemporânea no Estado e acolhendo os artistas, suas obras, inseguranças, desejos e oferecendo o máximo possível, com o apoio da SEMEAR e de toda a sua equipe.
Esse trabalho de curadoria foi antes de tudo um trabalho de prospecção, pesquisa e aprofundamento do conhecimento acerca da arte contemporânea produzida aqui e trouxe a tona mais algumas dezenas de nomes, mostrando que há muito por fazer.
Finalmente, cabe destacar o trabalho cooperativo de artistas, fotógrafo, designer, equipe gráfica, apoio técnico e de montagem, assessorias de imprensa e comunicação que viabilizaram em um curo espaço de tempo tal realização e, para encerrar, registrar o meu agradecimento pessoal e de todos os integrantes dessa empreitada a Cita Domingos

FONTE: Catálogo Desfiando o Rosário - Ultima Atualização: 21/12/2010

 
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